Bolsa Família trava empregos na construção civil? Especialistas apontam saída
Especialistas apontam que o Bolsa Família impacta o setor da construção civil e defendem mudanças no programa para incentivar empregos formaisO mercado de trabalho no Brasil vive um momento peculiar. De um lado, os números oficiais mostram pleno emprego, com taxa de desemprego em 5,8% no trimestre encerrado em julho e mais de 1,5 milhão de vagas abertas no ano.
De outro, a construção civil, um dos setores mais importantes para a economia, segue enfrentando dificuldades para contratar.
Segundo alguns executivos e analistas, parte desse impasse estaria ligada ao Bolsa Família. O programa social, essencial para milhões de brasileiros, também é visto como um fator que desestimula o retorno de beneficiários ao mercado formal.
Benefício ou barreira?
Cristiano Gregorius, diretor-executivo do Sienge, explica que o setor exige qualificação, esforço físico e rotina pesada, mas enfrenta concorrência direta com o Bolsa Família. O problema, segundo ele, vai além de conjunturas e já se tornou estrutural.
Para o economista Daniel Duque, do FGV-Ibre, a insegurança pesa na decisão do trabalhador. “Muitos têm mais medo de perder o benefício do que vontade de arriscar um novo emprego. O receio de ser demitido em poucos anos faz com que prefiram permanecer no Bolsa Família”, disse.
Tentativas de flexibilização do Bolsa Família
Em maio, o governo iniciou uma mudança: famílias que ultrapassaram o limite de renda de R$ 218 por pessoa, mas que seguem dentro de até R$ 706, podem continuar no Bolsa Família por 12 meses, recebendo metade do valor. A ideia era reduzir o impacto da perda imediata do benefício.
Mesmo assim, Duque avalia que a regra não resolve o medo de instabilidade. “O corte rápido dispara a insegurança do beneficiário”, afirmou.
Números que preocupam
Um levantamento do Hub do Investidor revelou que em 12 estados do Norte e Nordeste o número de famílias dependentes do Bolsa Família supera o de trabalhadores com carteira assinada.
Em regiões mais pobres, a proporção favorece os benefícios sociais.
Já em estados como Santa Catarina, o contraste é evidente: para cada família no programa, existem 11 vínculos formais de trabalho.
Esse cenário, segundo especialistas, pode estar freando justamente o setor da construção, que depende fortemente de homens jovens, o mesmo perfil que mais tende a deixar de buscar empregos por conta do programa social.
Empresários e propostas de mudança do Bolsa Família
André Bahia, empresário da construção de baixa renda, avalia que o Bolsa Família é necessário, mas hoje está “descalibrado”. Para ele, o programa gera a sensação de pleno emprego, mas mascara a realidade.
Na mesma linha, Luiz França, presidente da Abrainc, alerta que a informalidade vem afastando jovens do setor, o que fragiliza ainda mais o mercado.
Diante disso, um projeto de lei apresentado pelo deputado federal Pauderney Avelino (União-AM) propõe um “desmame” gradual:
- No primeiro ano, o trabalhador manteria o Bolsa Família integral.
- Se perder o emprego, volta automaticamente ao programa.
- A partir do segundo ano, o valor seria reduzido em 20% ao ano até ser zerado no quinto.
A ideia, segundo Avelino, é garantir segurança ao beneficiário e, ao mesmo tempo, incentivar a formalização no mercado de trabalho.