A era da comunicação instantânea transformou radicalmente as relações de trabalho, introduzindo novas conveniências — e novas crueldades.
Recentemente, um caso vindo dos Estados Unidos reacendeu o debate sobre a ética e a legalidade da demissão feita através de meios digitais, como o WhatsApp ou o SMS, expondo a frieza e o impacto emocional de tais práticas.
Vejamos a seguir.
Caso americano reacende o debate
O exemplo viral envolveu Kristin McCarley, uma corretora de imóveis americana que recorreu ao TikTok para compartilhar sua experiência.
A profissional relatou ter sido dispensada do emprego por meio de uma mensagem de texto enviada pelo chefe às 22h36 de um sábado.
A forma direta e impessoal do aviso, fora do horário comercial, gerou uma onda de indignação na plataforma, onde seu vídeo ultrapassou a marca de 1,7 milhão de visualizações.
Questão de respeito
Embora a legislação trabalhista no Brasil não proíba estritamente a demissão via mensagem, o caso de McCarley ilustra perfeitamente o problema central: o desrespeito à dignidade do trabalhador.
A demissão, mesmo que legalmente válida, é um momento delicado que exige consideração. Quando conduzida por uma mensagem de texto, especialmente em um horário de descanso e fora de um contexto formal, ela é percebida como um ato de covardia gerencial e desvalorização profissional.
A demissão por mensagem transforma uma decisão séria em algo trivial, negando ao profissional a oportunidade de uma conversa.
Cabe uma indenização por dano moral?
No contexto brasileiro, o caso de Kristin McCarley serve como um forte alerta para as empresas. Embora a CLT não barre o uso de mensagens para comunicar a dispensa, o Judiciário Trabalhista tem sido rigoroso ao analisar o tom e a forma da comunicação.
A dispensa por mensagem, sobretudo se ocorrer de maneira abrupta, em horários inconvenientes, ou com linguagem inapropriada, pode configurar dano moral.
Juízes brasileiros têm concedido indenizações a trabalhadores que provam terem sido submetidos a constrangimento ou humilhação devido à forma desrespeitosa de seu desligamento.
O episódio americano reforça a melhor prática empresarial: a comunicação de demissão deve ser sempre pessoal, reservada e formalizada, preferencialmente durante o expediente, garantindo a prova de ciência do funcionário e, acima de tudo, preservando a ética e o respeito humano na relação de trabalho.
O viral de McCarley é a prova de que a reputação de uma empresa pode ser seriamente prejudicada pela frieza de uma única notificação digital.
Entendimento da Justiça do Trabalho
Para que a comunicação digital seja considerada válida, a empresa geralmente precisa de um elemento que comprove a interação ou o consentimento do empregado.
O ideal é que o empregado responda à mensagem de demissão confirmando o recebimento ou manifestando ciência (ex: “Recebi a informação”). Essa resposta é a prova mais robusta.
O empregador pode utilizar prints de tela e registros do sistema (em caso de e-mail ou plataformas corporativas) para demonstrar a entrega. Contudo, esses registros precisam ser sólidos e, se contestados, podem exigir uma ata notarial para ter força probatória incontestável, elevando o custo e a complexidade do processo.
Muitos advogados recomendam que, se a demissão ocorreu digitalmente, ela seja imediatamente complementada pelo envio de uma carta de aviso prévio por e-mail formal e, se possível, uma carta com Aviso de Recebimento (AR) pelos Correios.
Isso garante a prova física e legalmente reconhecida de que a notificação foi enviada ao endereço do empregado.
Recomendações Jurídicas
Para mitigar riscos, a orientação é:
- Se for usar o WhatsApp, a mensagem deve ser clara e pedir uma confirmação de recebimento imediata do empregado.
- Sempre complemente o aviso por mensagem com um documento formal por e-mail (preferencialmente corporativo).
- Documente internamente a tentativa de contato e a forma de comunicação utilizada.
Em suma, embora a mensagem possa ser usada para iniciar ou complementar a comunicação, a prova de ciência é o elemento mais importante e a melhor prova é sempre uma confirmação escrita.